Arthur Soffiati
Não raro, confunde-se império com
cultura. Até mesmo estudiosos procedem assim. Nosso entendimento superficial
entende que havia apenas uma cultura em todo o império Inca, que se estendia do
sul da Colômbia ao norte da Argentina. A exposição “Tesouros ancestrais do Peru”,
no Centro Cultural Banco do Brasil do Rio de Janeiro até 5 de fevereiro do ano
em curso, na verdade, é uma exposição das culturas desenvolvidas por etnias
diferentes dentro do império Inca no território hoje correspondente ao Peru. Essas
culturas eram aparentadas, mas com personalidade própria. Uma das etnias mais
fortes em termos de expressão artística dentro do império é a mochica, que
ficava num território hoje dentro do Peru. A arte cerâmica mochica é famosa.
Está mais ou menos representada na exposição. Os mochicas expressaram a
sexualidade humana de um jeito que a cultura ocidental cristã chamaria de pornográfica.
Eles fizeram jarros moldados com cenas de sexo oral e anal. Não são pinturas. Os
próprios vasos têm formas eróticas. Para os mochicas, isso não era imoral. São
vasos lindos, mas não foram exibidos porque a exposição é aberta a adultos e
crianças de todos os entendimentos. Algum religioso, moralista, fundamentalista
poderia dizer que a exposição fazia a apologia do sexo.
Com a chegada dos europeus, o
trabalho missionário católico foi intenso. Mais tarde, o evangélico também. Os
nativos foram cristianizados, mas levaram para a arte religiosa, sobretudo para
a pintura, sua visão de mundo. A Escola de Cuzco é famosa por seus pintores
mestiços, que iluminavam seus quadros com cenas religiosas, dando-lhes um
caráter decorativo e piedoso. Ela também está pouco representada, não por ser
uma arte que possa ser considerada imoral. São cenas religiosas do
cristianismo.
Entende-se que não cabem mais as
exposições exaustivas, que exigiam horas de visitação e de leitura de textos
explicativos. Entende-se igualmente que ainda não existe um olhar antropológico
do visitante (haverá algum dia?) para compreender a abordagem de temas, como a
sexualidade, pelo olhar do outro.
Expressões artísticas andinas
pós-europeias