quarta-feira, 28 de julho de 2021

MANGUE VERMELHO NA REGIÃO DOS LAGOS

 Arthur Soffiati

Das poucas espécies de mangue que ocorrem no Brasil, a menos tolerante ao sal é o mangue vermelho. A Rhizophora mangle, espécie que ocorre no Sudeste do Brasil, encontra dificuldade de se enraizar na Região dos Lagos. O motivo é alta salinidade de suas águas interiores. As lagoas e os pequenos rios que nelas desembocam contêm alto teor de sal em suas águas, com destaque especial para a hipersalina lagoa de Araruama.

Minhas pesquisas só localizaram o mangue vermelho no estuário do rio Una, que desemboca na praia Rasa. Trata-se do único ponto favorável ao desenvolvimento dessa espécie. No córrego de Manguinhos e de Barrinha, só a Laguncularia recemosa se desenvolve com árvores de grande porte. .No Mangue de Pedra e no mangue da Ponta da Sapata, ocorrem o mangue branco (Laguncularia racemosa) e a siribeira (Avicennia schaueriana). Esta segunda é a espécie mais resistente a altas salinidades. Ela ocorre de forma exclusiva na praia de Foca, voltada para mar aberto no promontório de Búzios. 

Bosque de mangue branco em Manguinhos. Foto do autor

Entrando na lagoa de Araruama e nos pequenos rios que nela desembocam, como o rio Salgado, por exemplo, encontram-se exemplares de Avicennia schaueriana, mas não de Laguncularia racemosa. Em vez dela, desenvolve-se no âmbito da lagoa o mangue-de-botão (Conocarpus erectus), espécie não-exclusiva de manguezal, mas com alta resistência à salinidade. Pesquisas mais sistemáticas e apuradas sobre os manguezais da Região dos Lagos devem ser empreendidas nos sistemas lagunares de Saquarema e de Maricá. O manguezal é ainda um ecossistema que tem merecido pouca atenção dos pesquisadores. A imprensa publica, esporadicamente, matérias sobre os manguezais da baía de Guanabara, Barra da Tijuca e Guaratiba, passando ao largo dos mangues de Búzios e do Norte Fluminense. 

Exemplar de siribeira na lagoa de Araruama. Foto do autor 

Nesse mês de julho, a advogada Carolina Mazieri fotografou o Mangue de Pedra. Entre as fotos, notei a presença de um exemplar de mangue vermelho pequeno mas já em estado juvenil (folhas e galhos). Esta espécie não ocorria ali. Um único exemplar pode significar alguma mudança ambiental ou não significar nada. A corrente marinhas predominante na praia Rase descreve o movimento norte-sul. Ela transporta sementes (propágulos) das três espécies do rio Una ou São João até que elas encontrem local apropriado para germinar ou morram. As marés também fazem esse transporte. Até então, vingaram na praia pedregosa os mangues branco e siribeira. O vermelho estava ausente. Talvez, alguma semente tenha germinado no ambiente e morrido pela salinidade, embora, como vem demonstrando a geóloga Katia Mansur, a colina que se situa na retaguarda do Mangue de Pedra seja uma enorme caixa d’água doce que reduz a salinidade como se fosse um rio difuso. O Mangue de Pedra seria, assim, um manguezal ribeirinho disfarçado de manguezal de borda ou de franja.


Mangue-de-botão na lagoa de Araruama. Foto do autor 

Mas aquele exemplar jovem e solitário de mangue vermelho pode indicar também aporte de água doce em maior volume proveniente do rio Una, já que se acredita no despejo de água de esgoto tratado (ou não) pela concessionária Prolagos. Nesse caso, o isolado mangue vermelho pode anunciar algo que os moradores de Búzios vem repelindo desde 2013.

Afastada essa possibilidade, a jovem planta de mangue vermelho no Mangue de Pedra é bem vinda. Se ela chegar à idade adulta, produzirá propágulos e enriquecerá o mangue com sua prole.   

Mangue vermelho no Mangue de Pedra. Foto de Carolina Mazieri

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