domingo, 24 de março de 2024

COMO CIRCULAVAM AS ÁGUAS EM 1500 NO FAROL

Arthur Soffiati

            1500 é o ano em que os portugueses chegaram a uma terra que batizaram de Brasil. Não existiam ainda os atuais Farol, Campos, Norte-Noroeste fluminense, rio de Janeiro e um país chamado Brasil. As águas, porém, já circulavam no Farol de hoje em dia. Só que de maneira diferente. As águas vinham da lagoa de Cima pelos rios Ururaí e Paraíba do Sul até a lagoa Feia. Não só pela superfície, mas também de forma subterrânea. Daí, saíam da lagoa Feia por vários braços e formavam um rio que foi chamado de Iguaçu no século XVII. Esse rio chegava ao mar depois de receber também águas que transbordavam do rio Paraíba. Ele se transformou na atual lagoa do Açu depois de muitas obras de canalização e drenagem efetuadas no século XX.

            Da lagoa Feia, partiam também vários braços que formavam um rio menor que o Iguaçu. Era o lindo rio Bragança. Ele também desembocava no rio Iguaçu e, quando ficava muito cheio, abria uma barra no mar com muito esforço. Em tempos normais, ele engrossava na foz, formando o Lagamar. O sistema funcionava como mostra o mapa abaixo. 

Circulação das águas em 1500

            Em 1688, o capitão José de Barcelos Machado, grande proprietário rural, entendeu que a foz do rio Iguaçu podia se localizar abaixo da lagoa Feia e abriu uma vala que foi chamada de Furado. Ela funcionava quando as águas das chuvas se acumulavam no continente. Então, por meio do trabalho escravo, a vala era aberta para que as águas escoassem mais rapidamente para o mar. O rio Iguaçu, contudo, continuou existindo, só que com menos força. Ele também fechava sua barra quando a água perdia força.          

Circulação das águas em 1688

Entre 1942 e 1949, o Departamento Nacional de Obras e Saneamento, valendo-se de planos anteriores, entendeu que o melhor caminho para escoar as águas que se acumulavam no continente era abrir um comprido canal da lagoa Feia ao mar. Foi o canal da Flecha, que consolidou a barra da vala do Furado, sobretudo com a construção de dois molhes de pedra na década de 1980. O antigo rio Iguaçu transformou-se de vez na lagoa do Açu. Uma parte dele é vista ainda atrás do Farol. Está todo fragmentado e poluído.
Circulação das águas a partir de 1949

O rio Bragança foi tão cortado por obras de drenagem que não mais existe. O Lagamar não tem mais força para abrir sua barra e chegar ao mar. A lagoa do Açu desenvolveu outro equilíbrio. De rio, transformou-se em lagoa. Em toda a extensão do Farol, o nível do lençol freático é alto, sobretudo no Açu.

      Quando chove muito, a água se acumula em todas as lagoas que restaram na costa que vai da lagoa de Gruçaí a Barra do Furado. Levemos em conta que as chuvas estão mais abundantes que no passado porque o aquecimento da Terra está aumentando por conta dos gases do efeito-estufa, liberados por atividades humanas. A evaporação das águas oceânicas é maior. Quando uma massa fria se forma na atmosfera, o vapor d’água se transforma em água líquida e cai em grande profusão sobre os continentes. Esse fenômeno pode acontecer até nos desertos, como ocorreu recentemente no Saara.

Como o canal da Flecha centralizou o escoamento de água continental para o mar, ele tem se mostrado insuficiente para lançar toda chuva que se precipita na região. Então, a principal solução encontrada é abrir a barra das lagoas de Gruçaí, Iquipari e Açu. Trata-se de uma solução emergencial para aliviar a vida dos moradores da zona costeira entre o Paraíba do Sul e Barra do Furado, mas provoca um choque ambiental nessas lagoas que já foram rios no passado. Estamos vivendo essa situação com as volumosas e contínuas chuvas nos estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo.

 


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