Arthur Soffiati
Do sexto andar do prédio onde moro,
contemplo uma vasta planície que se estende a meus pés. Estamos em Campos dos
Goytacazes, estado do Rio de Janeiro, Brasil. Essa planície foi construída por
um rio de porte médio. É o rio Paraíba do Sul, com quase 1.200 km. Na borda
dessa planície, o mar formou uma grande restinga. Havia muitas lagoas nela
antes da chegada dos europeus. As plantas que desceram das montanhas tiveram de
se adaptar à grande umidade. Colonizaram o território as espécies resistentes à
água. A fartura de alimentos era grande para os povos nativos que a habitavam.
Recuando 500 anos, não haveria pontos
altos para contemplar a imensa planície. Ao custo de muitas obras de drenagem a
partir do século XVII, os núcleos urbanos em estilo europeu foram sendo construídos.
Mesmo assim, apenas 150 anos após a chegada de Pedro Álvares Cabral. A primeira
tentava de colonização pelos portugueses, entre 1539 e 1547, fracassou. Do
outro lado do mundo, a colonização portuguesa prosperava em Goa, Damão, Diu,
Malaca, Macau e Timor. Ela se expandiu mais na Ásia onde estavam as riquezas
que interessavam aos europeus. Toda a região aonde estou fazia parte da
Capitania de São Tomé, doada a Pero de Gois.
Árvores de grande porte, que cresciam
na zona serrana da Capitania, não desciam até a planície em virtude da grande
umidade. Era um mundo líquido com poucas áreas ligeiramente mais elevadas em
tempos de estiagem. A partir de 1630, o gado europeu e a cana-de-açúcar
asiática foram se expandindo pela mão do colono. Árvores da montanha foram
sendo trazidas para as partes baixas. Da Ásia, em grande parte a partir de Goa,
chegaram das espécies herbáceas às espécies arbóreas. Os capins fura-chão e
cidade, vieram da Índia, assim como a mamona (Ricinus communis, da família Euphorbiaceae),
a mangueira (Mangifera indica, da família Anacardiaceae), a jaqueira, a amendoeira, a fruta-pão, a lexia, o
coqueiro, o jambo e outras mais.
Ilustração de mamona
Hoje, olho para baixo e vejo à minha
frente muitas mangueiras e amendoeiras. Em menor quantidade, encontro
jaqueiras, lexia, fruta-pão e jambo. Andando pelas ruas dessa cidade erguida
sobre lagoas, é muito comum encontrar mamonas crescendo de forma espontânea nos
terrenos baldios.
Ilustração de mangueira por Michael Boym, em Flora
Sinensis, 1656
Um pedaço da Índia está à minha
frente, assim como um pedaço do Brasil deve estar em Goa. Mas poucas pessoas
sabem disso ou por isso se interessam.
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