sexta-feira, 13 de janeiro de 2023

MAPAS PARA DESAPARECER

                                                                     


                                                                       Arthur Soffiati

Que eu saiba, poucas ficcionistas publicaram em 2020. Por outro lado, logo nos primeiros meses de 2021, as mulheres desandaram a publicar. Alguns livros vêm datados de 2020, mas o lançamento deles ocorreu em 2021. Estou fazendo um grande esforço para acompanhá-las. Uma delas é Nara Vidal, com o livro de contos “Mapas para desaparecer” (São Paulo: Faria e Silva: 2020). A autora não é iniciante. Ela ganhou o prêmio Oceanos em 2019 com seu primeiro romance. Mora na Inglaterra desde 2001 e volta com contos.

Ao longo dos onze contos que compõem o livro, Nara Vidal mistura realidade e fantasia, como no caso da filha que desapareceu, em “Castanheira”. É o primeiro conto do livro e, a meu ver, o melhor. Em todos, a condição da mulher é o centro. Em quase todos, as mulheres são casadas e têm filhos. Mas o que aflora é a monotonia da vida conjugal. Uma filha que desaparece sem que haja maiores preocupação das pessoas, além da mãe, é surreal. E os recados para os homens é direto: “comprar uma Ferrari (...) é necessariamente o sonho de todo homem que tem o pau pequeno (...) classe não se compra e nem pau grande.” Algo inusitado, pois esse é o desejo de muitos homens que não querem comprar uma Ferrari. Basta ver a oferta de produtos que circulam nas redes sociais prometendo aumento de pênis.

Em “Cipó mil-homens”, a solidão domina. Uma mulher mora numa casa isolada do mundo. Por ali passam caminhoneiros, mas só existe aquela casa. “Desde os treze anos que eu rezo para Deus e abro as pernas para os homens, mas nunca vingava.” A mulher perde filho após filho por aborto espontâneo, mas finalmente um chega aos nove meses. Ela e o filho sofrem abusos e se acostumam com a situação. É um conto que mistura realidade com absurdo.

Mas os contos começam a perder força à medida em que se avança na leitura. Em “Casamento de Daniel”, a personagem feminina se cansa do marido, do seu modo de se relacionar sexualmente com ela, mas se acostuma à sua situação. A maioria das mulheres casadas vive assim. Alguns contos são supérfluos no enredo e na construção. É o caso de “Lucien Roland”, que não se sustenta como ficção de realidade ou de absurdo. “O casamento de Letícia” peca pelo esquematismo. A imprevisibilidade de quase todos os contos é previsível.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

TEMPESTADE NO DESERTO

Arthur Soffiati             Não me refiro ao filme “Tempestade no deserto”, dirigido por Shimon Dotal e lançado em 1992. O filme trata da ...