domingo, 22 de janeiro de 2023

SOLUÇÃO DE DOIS ESTADOS

Arthur Soffiati

Em “Solução de dois Estados” (São Paulo: Companhia das Letras, 2020), seu mais recente romance, Michel Laub enfoca a trajetória de dois irmãos, entrevistados por uma cineasta alemã traumatizada pelo morte do seu marido por assassinato. A irmã é obesa. Pesa 130 quilos. O irmão é um empresário do ramo de fitness. A irmã sofreu uma agressão durante um debate sobre arte e política em 2018.

A trajetória de ambos começa no governo Collor. O pai do casal de irmãos favorece a vida da filha custeando seus estudos na Alemanha. O filho herda os negócios do pai depois de sua morte e fica cuidando da mãe. O rumo dos dois irmãos se encaminha em direções diferentes. A irmã dedicou-se à arte usando o próprio corpo. Ela sofreu bulling na adolescência por ser obesa. Agora assumiu e exibe sua obesidade. Já o irmão seguiu uma rota que vai desembocar na tendência direitista do governo do Brasil a partir de 2019. É empresário evangélico e conservador.

A irmã é contestadora. Ambos discutem com a cineasta, expondo sua dor em alguns momentos. O romance é tratado na forma de um pré-roteiro com as duas vozes se manifestando alternadamente e com material extra a ser aproveitado. O título do livro, de alguma forma, refere-se à condição de judeu do autor, que defende a solução de dois Estados para a questão palestina: um Estado judeu e um Estado palestino. Essa solução poderia ser aplicada aos irmãos, que se afastaram sem a possibilidade à vista de uma reconciliação.

Michel Laub é um dos grandes ficcionistas brasileiros da atualidade na minha opinião. Ele usa uma técnica de aproximação do tema abordado de uma forma bastante original. Na primeira rodada, parece que aconteceu algo simples e bastante evidente. Na segunda rodada, os detalhes começam a aparecer. Na terceira, o que parecia simples começa a se mostrar complexo. E assim por diante. Ao pretender abordar a polarização política que domina o Brasil atualmente, ele remonta ao tempo do governo Collor de Melo, mas não se sai tão bem como nos seus romances anteriores. A técnica cinematográfica não parece ser a sua praia. 

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